terça-feira, 25 de novembro de 2014

Pequeno trecho do livro "Contraponto" (Aldous Huxley)

“Percebo agora que o verdadeiro encanto da vida intelectual –da vida consagrada à erudição, à pesquisa científica, à filosofia, à estética, à crítica –é a sua facilidade. É a substituição de simples esquemas intelectuais em lugar das complicações da realidade; da morte silenciosa e rígida em lugar dos movimentos desconcertantes da vida. É incomparavelmente mais fácil saber muitas coisas, digamos, sobre a história da arte, e ter idéias profundas sobre metafísica e sociologia, do que conhecer pessoalmente, intuitivamente os seus semelhantes e ter relações satisfatórias com seus amigos e suas amantes, sua mulher e seus filhos. Viver é muito mais difícil que o sânscrito, que a química ou que a economia política. A vida intelectual é um brinquedo de criança; eis por que os intelectuais têm uma tendência para voltar à infância, para cair em seguida na imbecilidade, e, finalmente, como demonstra com clareza a história política e industrial destes últimos séculos, a tornarem-se homicidas loucos e selvagens. As funções reprimidas não morrem; deterioram-se, decompõem-se, revertem ao estado primitivo. Mas enquanto isso é muito mais fácil ser criança, louco ou besta do que homem adulto harmonioso. É por isto que (entre outras razões) há tanta procura de instrução superior. A corrida para os livros e para as universidades lembra a corrida para as tavernas. Essa gente necessita afogar a consciência das dificuldades que há em viver decentemente neste grotesco mundo contemporâneo; eles tem necessidade de esquecer a sua deplorável insuficiência como cultivadores da arte de viver. Uns afogam suas tristezas no álcool,mas outros, ainda mais numerosos, as afogam nos livros e no diletantismo artístico; uns procuram achar o esquecimento de si mesmos na libertinagem, na dança, no cinema, no rádio; outros, nas conferências e nas ocupações científicas. Os livros e as conferências são melhores para afogar as mágoas do que a bebida e a fornicação; não deixam dor de cabeça nem essa sensação desesperante do post coitum triste.”

(Huxley, no clássico "Contraponto")

Nenhum comentário: